Hoje, 30 de novembro de 2025, os amantes de Poesia celebram a memória e o legado de Fernando Pessoa nos 90 anos de sua morte. O mundo de língua portuguesa, de Macau ao Brasil, tem a sorte de desfrutá-lo no original. A poesia de Pessoa acompanhou-me desde os tempos de universitária e segue acalentando os meus dias de crepúsculo.
Selecionei um pequeno poema de Ricardo Reis, o heterônimo que mais aprecio, para prestar minha reverência a um dos grandes poetas do século XX. A Editora Tinta da China, de SP, publicou há um mês um belo volume com a poesia completa desse heterônimo, com o estabelecimento de texto, novas percepções, paratextos e versos inéditos, inclusive, por Jerónimo Pizarro e Jorge Uribe. O volume tem capa dura e 500 páginas. Uma preciosidade, que pretendo adquirir no início de 2026.
SÁBIO É O QUE SE CONTENTA
Ricardo Reis em 16.06.1914
Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo,
E ao beber nem recorda
Para quem tudo é novo
E imarcescível sempre.
Coroem-no pâmpanos, ou heras, ou rosas volúteis,
Ele sabe que a vida
Passa por ele e tanto
Corta à flor como a ele
De Átropos a tesoura.
Mas ele sabe fazer que a cor do vinho esconda isto,
Estive em São Paulo por seis dias em outubro de 2025. Assisti a seis filmes na 49. Mostra Internacional de Cinema de SP, fui à 36. Bienal de Arte de SP, visitei o prédio novo do MASP, fui a mais meia dúzia de mostras, assisti a três peças teatrais, conheci as instalações do Museu de Diversidade Sexual - que fica na estação de metrô República, pela entrada do extremo oposto à Av. Ipiranga -, e visitei, finalmente, a Biblioteca Mário de Andrade, que está completando neste mês 100 anos de fundação, com eventos e celebrações. Deem uma olhada em meu canal do Youtube no final de outubro, "Rocandel do outro lado do mundo", para verem as imagens dessa biblioteca e da livraria que visitei, a aconchegante Gato sem rabo (menção a uma passagem de uma narrativa de V. Woolf), especializada apenas em publicações de autoras mulheres.
Esta postagem é para destacar a mostra fotográfica de Gordon Parks, no IMS de SP (Av. Paulista, 2424). Ela ficará em cartaz até 1º de março de 2026. Vá lá visitá-la. A curadoria é de Juliana Damaceno. É algo especial e relevante, estética e politicamente. As 200 fotografias dessa exposição vieram da Fundação Gordon Parks, nos EUA, além de seus filmes e documentários. Ele também foi um homem do cinema. É a maior mostra e a mais completa já apresentada na América Latina. Eu ouvi falar no Parks nos anos 80, quando era universitária. Vi uma foto sua em uma revista antiga. Ele esteve no Rio de Janeiro nos anos 60 e fotografou a Favela da Catacumba. As fotos gerada foram publicadas na forma de ensaio em uma edição da revista Life em 1961 com o título Freedoms's Fearful Foe: Poverty, dando ênfase a uma família favelada negra de sobrenome Silva. O ensaio gerou uma série de manifestações. No Brasil, o governo e a imprensa da época consideraram a matéria extremamente estereotipada. Nos EUA, muitas pessoas se comoveram com a pobreza da família Silva estampada nas fotos e na reportagem de Parks e enviaram doações em espécie para que os Silva se mudassem para uma casa adequada e para o tratamento do menino Flávio, o caçula da família, que sofria de uma asma ostensiva.
Gordon Parks era negro e, como tal, registrou e testemunhou a pobreza, a exclusão e a busca incessante pelos direitos civis de parte dos negros estadunidenses, notadamente, nos 60. As imagens são fortes e emblemáticas. Há registros de manifestações e atos públicos, de Malcolm-X no palanque, de M. Luther King e de Cassius Clay (depois de convertido, Muhammad Ali). As fotos que retratam a pobreza no Harlem, em NY, e em Chicago são chocantes, porém belas (tão chocantes quanto a miséria que testemunhamos no Brasil). A luz e a essência capturadas fizeram dele um artista requisitado. Ele foi o primeiro fotógrafo negro a ser contratado por uma revista, a prestigiosa Life, em 1948.
Acordei-me hoje e logo já estava ouvindo música, como todos os dias. Em homenagem à memória de Ozzy Osbourne e de sua carreira no rock mundial, ouvi "Paranoid"
Meu consolo é que assisti a três show da Black Sabbath, um show do Ozzy e banda e acompanhei sua despedida, ao vivo, em um festival de rock beneficente que durou 10 horas, em Birmingham, UK, há 18 dias, e reuniu, aproximadamente 45 mil pessoas.
Tua voz foi trilha sonora de muitos eventos de minha vida. Obrigada por tudo e por tanto! R.I.P., Ozzy!
Estive em Santa Cruz do Sul em 30 de abril de 2025, data que marcava, então, o aniversário de falecimento de um dos artistas mais interessantes de sua geração, o saudoso Belchior.
Belchior passou uma década entre o Uruguai e o Sul do Brasil. Nos últimos quase quatro anos de sua vida, esteve em Santa Cruz do Sul/RS acolhido por um antigo amigo e fã dos anos 80, o jornalista, radialista e escritor Dogival Duarte. Esta é a matéria-prima do livro de Doge, os bastidores da estada de Bel em Santa Cruz do Sul, muitas conversas sobre a poesia, a literatura, a cena musical brasileira e as viagens...
Dogival é maranhense, na verdade, um retirante moderno como Belchior, que era cearense. A poética das canções de Belchior possui uma forte literariedade, que dialoga com várias tradições literárias clássicas e modernas.
O lançamento do livro na noite de 30 de abril foi um sucesso! Um pocket show de covers do Belchior ocorreu na ocasião, levando mais de cem pessoas a cantarem em uníssono os refrões das canções do bardo cearense.
Aos domingos, às 20h, Dogival Duarte é o mentor e locutor de um programa na Web Rádio Rural do Ceará, os "Labirintos Noturnos", no qual ele declama poemas, comenta as intertextualidades das letras de Belchior e veicula uma seleção do Cancioneiro Belchior, composto por um pouco mais de 130 canções registradas para o deleite da nação belchioriana.
Para os que quiserem adquirir o livro independente, de quase 400 páginas e com fotos inéditas ao final da edição, podem fazê-lo através de um contato direto com o autor pelo e-mail:
Alejo Carpentier nasceu em Lausanne, Suíça, em 1904. Faleceu em Paris, onde se manteve exilado, no dia 24 de abril de 1980. Ele cresceu em La Habana e vivenciou uma série de fatos históricos importantes em sua Cuba amada, alinhado à ideologia de esquerda revolucionária.
Nos anos 80, deparei-me com sua obra e destaco dentre seus livros publicados"O recurso do método", de 1974, cuja fonte de inspiração é o livro de René Descartes, "O discurso do método" (1637). Eu era uma estudante de Filosofia e fiquei apaixonada pelo real maravilhoso que emana de seus escritos.
Suas reflexões históricas, de um ponto de vista totalizante, resgatam fatos sociais que agitaram La Habana nos anos 20, em especial. Esse espectro temporal chega até o início da revolução cubana, em 1959, em sua última obra publicada em 1978, "A sagração da primavera".
Tive trabalho para encontrá-la em um sebo em março, aqui em Porto Alegre. O livro tem pouco mais de 500 páginas, é complexo e polifônico, minado de referências culturais e citações em vários idiomas. Comprei uma tradução para o Português realizada por Mustafa Yazbek, em uma edição de 1987, que saiu pela Editora Brasiliense.
O título dessa obra reporta-se ao balé homônimo de Igor Stravinsky, cuja estreia ocorreu em 1913. Uma possibilidade de interpretação do título é associá-lo à própria revolução cubana, que foi um novo despertar para o país sob o viés histórico-dialético do autor.
A identidade cultural e social de Cuba vai sendo desvelada através da música cubana, que tem proeminência em relação às outras expressões artísticas da ilha, equiparando-a à beleza da música de Stravinsky.
Abaixo, selecionei uma passagem dessa última obra de Carpentier para atiçar o interesse daqueles que apreciam uma obra longa e difícil:
"(...) Os cotovelos no balcão do bar, Ernest Hemingway, de costas para a porta de entrada, encurvava seu largo dorso de lenhador, erguendo as manoplas ao calor de uma discussão sobre técnicas do jogo de pelota basca, o jai-lai, com um pitoresco amigo seu, engraçado cura basco, que alternava as artes desse jogo com o aspergir do hissope. 'Cumprimente-o', disse-me Vera, ansiosa por conhecê-lo. 'Lembre-o da casa de Gertrude Stein' (...)" (p. 204).