O ano de 2010 marca os dez anos da publicação do livro de Edgar Morin, intitulado “Os sete saberes necessários à educação do futuro”, edição da Editora Cortez com a UNESCO. Em setembro, na capital cearense, o próprio Morin e algumas dezenas de educadores, sob a chancela da UNESCO, estarão discutindo, de modo avaliativo, o que foi possível implementar na educação, tendo em vista os ‘sete saberes’, ou, ao menos, o que se discutiu no horizonte pedagógico ao longo de uma década. Os ‘sete saberes da educação’ iniciam-se com a ideia fundamental de que o conhecimento é circular. A não-circularidade do conhecimento sobre o conhecimento gera erro. Somos ‘máquinas’ de respostas imediatas e, muitas vezes, respostas essas sem fundamento e densidade. A educação, nesse sentido, deveria se assentar no cânone das indagações e menos na busca de respostas fáceis, o que induz fatalmente ao erro. Tendo em vista que é possível aproximar ’os sete saberes’ da educação dos princípios da doutrina budista, há nessa também uma preocupação em evitar o erro do caminho daquele que pretende evoluir (erro, em sânscrito, akutishiki, ou seja, aquilo que nos desvia do caminho correto). O segundo saber diz respeito ao problema da fragmentação. O mundo continua sendo percebido e conhecido por boa parte dos indivíduos como algo “fora” de nós e totalmente fragmentado! A ideia de conjunto, de totalidade, é o segundo saber, que permite vislumbrar os saberes globais, no qual estão inseridos os saberes locais. A totalidade, em algumas culturas orientais, é representada pelo número quatro. Não é à toa que a doutrina budista preconiza suas quatro verdades, que são, sinteticamente, as seguintes: a existência implica sofrimento; o sofrimento é consequência da ignorância e do desejo; a superação do sofrimento dá-se com a supressão da ignorância e do desejo; e, finalmente, há passos para suprimir a dor e o sofrimento de nossas vidas. Uma delas é a meditação, porque Buda não dissociava a conquista do conhecimento de uma determinada prática de meditação. A unidade e a diversidade da condição humana é o terceiro saber, que deveriam ser internalizadas, dialeticamente, pelos sujeitos que constituem a educação do futuro. No dia-a-dia da sala de aula, pouco se sabe sobre o que é unidade/diversidade dos fenômenos e o quanto a diversidade, especialmente, deve ser respeitada e ‘praticada’, a partir do exercício de alteridade. Pensar o destino comum do planeta: eis o quarto saber para a educação do futuro. Enquanto o conceito de “cuidado” e do “cuidado de si”, perdido lá na antiguidade clássica, não for resgatado em sala de aula, o lixo, para falar em algo bem simples e acessível, continuará sendo jogado de modo indiscriminado no chão. O “cuidado de si” é uma forma de estar atento ao que está sendo pensado e ao que se passa em nosso entorno. Evocando-se o “cuidado de si”, garante-se o cuidado com o Outro, com o planeta. É preciso ensinar os educandos acerca das “incertezas”, o quinto saber. Abordar a questão das incertezas, no âmbito da educação, no horizonte teórico e prático, é preparar a percepção de todos para os imprevistos e o inesperado. A educação para a impermanência, para a transitoriedade, para a efemeridade dos fenômenos, conecta-nos com a doutrina budista, novamente, para a qual a anitya, a impermanência, dá-se diariamente, no exercício mental e na experiência sensível, no sentido de promover o “desapego” das coisas materiais, de nos colocar no centro do tempo presente e de aceitar a transformação permanente desta vida (em sânscrito, maya, ou seja, ilusão). A educação só poderá ser pacífica e solidária quando o exercício de ‘autoconhecimento’ (em sânscrito, atmabodha), tão caro ao budismo, fizer parte do processo da construção de conhecimento. Como ser solidário com o Outro, como aceitar a diversidade e as diferenças, se a educação não proporcionar a compreensão e a vivência dos elementos constitutivos da própria humanidade e não oferecer meios para a autorreflexão? A compreensão solidária apresenta-se como o sexto saber, para Morin. No budismo, ser solidário, alegre e benevolente com o Outro faz parte da felicidade ‘absoluta’, aquela que vem de dentro para fora e não tem relação com o patrimônio material que cada um acumula nesta existência. Por fim, introduzindo o sétimo saber para uma educação futura, é preciso de uma nova ética, que dê conta desse conjunto de saberes. A ética da humanidade, da autonomia e da participação humana tem de ser forjada “nas mentes” dos educandos do século XXI, como afirma Edgar Morin. Transcender a autonomia individual é emancipar-se de uma condição, muitas vezes, passiva e que sinaliza um déficit de racionalidade, própria da ação comunicativa entre os indivíduos de nossa sociedade. Todos temos de participar da construção de uma nova “excelência” moral para este século, para o aqui e o agora!
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