Como eu havia dito neste blog, fui assistir ao longa de Lars von Trier em uma Sala Itaú, em Porto Alegre, na terça, dia 14 de janeiro. Fiquei agitada com o som pesado, no prólogo do filme, de uma banda alemã que ouço há anos, a Rammstein. O tema é intitulado "Führe mich", o qual ouço agora em casa, com uma batida pesada magnetizante, cujo estribilho ecoa assim: "Guia-me, abraça-me (ou prenda-me?)". Como ao final do filme percebi que Lars von Trier agradece a várias pessoas e, dentre elas, seu conterrâneo dinamarquês Lars Ulrich, batera do Metallica, vou aguardar para ver se rola um tema dessa banda na segunda parte de "Ninfomaníaca", que von Trier denomina de segundo "volume" (possivelmente, porque há uma estrutura musical no filme). Esperemos que entre em cartaz no Brasil antes de março. O filme é repleto de erudições, intertextualidades e na trilha há um momento, na primeira parte, em que se ouve o sagrado Johann S. Bach (um prelúdio polifônico). Não sei por onde iniciar meu comentário, porque, já alavancado pela música, quero fazer remissão às obras literárias que o filme sinaliza e às artes visuais, posto que algumas cenas mais parecem fotogramas e lembram-me a obra de Egon Schiele. Esse pintor austríaco, tinha um ateliê próximo a Viena, que se tornou ponto de menores delinquentes. Ele mesmo abusou de uma menina e foi preso. Pintou inúmeras telas e fez esboços de genitálias, sempre com modelos. Obviamente, a sociedade do decadente império austro-húngaro não o compreendeu e o rechaçou, considerando o fato de que o modelo de arte, à época, era o de Klimt. Voltando ao longa, o elenco de "Ninfomaníaca" conta novamente com Stellan Skarsgard, ator sueco que andou fazendo filmes linha B, após ter participado de "Dogville", de Lars von Trier em 2003. Apreciei muito o perfomance de Skarsgard em um longa de Milos Forman, de 2006, no papel de Goya, cujo roteiro foi escrito pelo diretor com a parceria de Jean-Claude Carrière. Um belíssimo filme! Charlotte Gainsbourg, a ninfomaníaca do filme (na juventude, ela é representada pela atriz Stacy Martin), é anglo-francesa, cantora e filha de Jane Birkin; tem um currículo expressivo na música, no cinema e como modelo fotográfico. Nós a vimos na pele de Claire, há pouco, no "Melancholia", de von Trier, em 2011, filme que causou a maior evasão de uma sala de cinema que já presenciei em minha vida. Lembro-me de Charlotte atuando em "21 gramas", de 2003, do diretor Alejandro G. Iñarritu. Depois, em "Não estou lá", de Todd Haynes, em 2007, filme sobre a vida e a obra de Bob Dylan. O pesado marketing, que vem desnudando em partes o longa "Ninfomaníaca", que, originalmente, tem oito horas de duração, já me deixou vários dias à procura de teasers liberados pela produção no site do You Tube. Ainda sobre o elenco, vi Uma Thurman, em uma rápida aparição em uma cena de adultério, Christian Slater, que não esqueço porque fez Adso, o noviço de "O Nome da Rosa", além de um ator em início de carreira, que conheço pouco: Shia LaBeouf. Sobre as intertextualidades literárias, Edgar Allan Poe é citado no início do primeiro volume e creio que o nome da protagonista "Joe" faz algum jogo fonético com "Poe". No prólogo, quando toca o tema da Rammstein, Joe, a ninfomaníaca, está deitada, machucada e desacordada sobre o chão de um beco escuro. Note-se que é inverno, cai uma neve fina, cujos flocos contrastam com a cena escura e tensa. O personagem de Skarsgard a leva para sua casa e a trata. Não há como não fazer uma conexão com o final da vida do próprio Poe, em uma rua de Baltimore, caído no meio-fio, de tanto beber. Joe ouve de seu protetor essa história e sobre o delirium tremens que acometeu Poe. "A queda da Casa de Usher" é um dos contos que mais aprecio de Edgar Allan Poe. Seu protagonista vive em total desacordo com o ritmo de seu mundo. Parece-me que von Trier inspirou-se nessa narrativa para conceber sua ninfomaníaca, embora eu não possa afirmar, porque não assisti à segunda parte, ou volume. A heroína vive de sexo, alimenta-se de sexo e inicia uma 'queda' rumo às perversões mais sombrias da condição humana. Só sei que Williem Dafoe vai aparecer na segunda parte e não sei a que virá, porque não leio os textos de críticos, até escrever o meu próprio comentário. Tenho a intuição, pelos teasers que vi, que será pesada! Retomando o longa, a pesca é uma forte metáfora presente no roteiro e em imagens documentais inseridas no filme. Joe percebe que há uma mosca ninfa presa entre penas/plumas na parede da casa de seu protetor. Usa-se um tipo de mosca como isca de pesca, mosca que tem três fases de ninfa; depois, ela torna-se um inseto adulto. Tive um pai, que, além de artista gráfico e jornalista, era pescador e não raras vezes fui eu a contemplada para acompanhá-lo em pescarias rápidas, de um dia. Imaginei cenas do texto de "Moby Dick", de H. Melville, das aventuras do 'Pequod', enquanto o personagem de Skargard explica para Joe os detalhes sobre a pesca com a mosca ninfa. Ao final do filme, após as narrativas eróticas da menina Joe, ouve-se novamente o som de Rammstein, fechando o primeiro volume. Uau! David Lynch que se cuide! Aguardemos a segunda parte, que promete! De qualquer modo, o que vi na tela é muito honesto e sua abordagem é séria! Espero que ajude, no 'espelhamento', a muitas pessoas, problemáticas e mal-resolvidas em relação às suas sexualidades! Abraço a todos!
Assisti ontem, gostei muito! Bj
ResponderExcluirDepois, comentarei aqui, San! Beijos!
ResponderExcluirÓtimo comentário, Rô, gostei muito das referências mencionadas, especialmente no que se refere ao Egon Schiele, que me arrebatou quando estive em Viena! Como havia te comentado, não pude evitar comparar a personagem-título com o Brandon, do filme "Shame". O Brandon me convenceu mais como uma criatura obcecada pelo sexo, cuja compulsão chegava até a causar sofrimento - nele e nos demais - e jamais era totalmente satisfeita. Acho que senti falta dessa premência na Joe... Beijo
ResponderExcluirÉ verdade, San! O Brandon é compulsivo e passa mal após tanto transar. tens razão, faltou o mal-estar à compleição da personagem Joe. Ela apenas chora, mas parece que não tem um mal-estar físico após tanto sexo. Vamos ver na segunda parte (segundo volume). Obrigada por sempre leres os meus posts e os comentares! beijos, amiga!
ResponderExcluirMãe, gostei muito dos seus comentários, com certeza eu seria incapaz de traçar tantas conexões entre obras literárias e músicas. Mas no fim você não disse, sobre o que é o filme, afinal? Beijos, Mi
ResponderExcluirwww.recantodami.com
Mi,é sobre as memórias da personagem. Se ela é ninfo, é preciso explicar mais?
ResponderExcluirSim mãe, para quem não viu o filme, é preciso haver um resumo da história. Já sabemos que ela é ninfo, mas isso no fundo não diz muito. Beijos
ExcluirMi, coloquei um trecho a mais no texto para que entendas do que o filme trata. Beijos!
ResponderExcluirObrigada mãe. Beijos
ExcluirMuito bom, Rô! Você pinçou do filme mais uma razão (além do cineasta) para eu querer vê-lo o quanto antes: os possíveis intertextos com Poe e Melville, dois autores que aprecio bastante. Além, é claro, do nosso numinoso Bach! Abraços, querida, e até breve!
ResponderExcluirFá, querido, que bom que leste o meu post. Sabes que adoro os teus comentários e se tiveres correções a fazer, por favor, eu ficaria grata! Teu niver é dia 25. Estou procurando algo de especial para te ofertar! Abração e obrigada!
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