Passei uma tarde de sábado, em Porto Alegre, feito uma hedonista - como sempre! Fui tomar o meu café, comprei vários livros na Livraria Cultura, DVDs e CDs, ao todo, seis presentes para amigos queridos (Gilson Klemz, Luciani Voght, Elstor Petry-Loseiret, Julia Schnaiders e Rafael Engel), todos de aniversário: quatro atrasados e dois nats futuros! Não gosto de dar presentes por obrigação, mas ofertar algo especial que esteja em consonância com aquele amigo que o recebe. Comprei "Der Sandmann", do ETA Hoffmann para mim, mais o "Leben ist Werden", do Hesse, no ano de seus 50 anos de falecimento. Encontrei um romance do Hesse para o Gilson, meu professor de Alemão, e sua esposa Luciani. DVD e CD de interpretações de composições de Villa-Lobos para o Elstor, DVD do 'Prodigy na Alemanha' para o Rafa e um Kamasutra para a Júlia. Para mim, encontrei um CD importado com uma seleção de Satie variada, com Pascal Roge ao piano. Depois, fomos assistir ao "Os Intocáveis" ("Les Intouchables", de 2011), de Eric Toledano e Olivier Nakache. Não vou comentar aqui o longa francês. Passarei, de imediato, às minhas impressões da peça "Mutter Courage und ihre Kinder", de Bertold Brecht, texto concebido em 1938, um ano antes do início da Segunda Grande Guerra, e ambientado durante a Guerra dos Trinta Anos, na Europa. Cheguei cedo ao Theatro São Pedro, porque eu teria de retirar o meu ingresso com a equipe do 'Porto Alegre em Cena', uma vez que o mesmo foi comprado pelo site do Ingresso Rápido. Cheguei cedo demais, antes de a equipe se instalar no saguão do TSP. Todavia, cheguei no momento em que os atores do grupo "Berliner Ensemble", fundado em Berlin por B. Brecht, em 1949, estavam ali, rindo e montando um pequeno espaço para a venda de posters, programas da peça e camisetas do grupo. Lá fui eu com o meu Alemão pré-básico. Cumprimentei-os e perguntei o preço das camisetas. Parei aí. Bloqueei! Minutos após, comecei a falar em Inglês e foi um papo muito bacana. Contei a eles que conheci Berlin em 2011 e os pontos que visitei, que estudava Alemão e que voltaria para lá em 2013. Um dos atores foi muito simpático, falou bastante em Berlin, perguntou-me se eu morava em Porto Alegre, trocamos e-mails e ele me deu uns materiais do grupo. Comprei uma camiseta preta do "Berliner Ensemble", com o slogan em vermelho. As filas foram se formando no saguão e eu tinha ingresso de camarote, na lateral direita do palco, no segundo andar; bem-localizado o assento. A peça iniciou-se com uns minutos de atraso, lá pelas 20h10, e eu sabia que haveria três horas de espetáculo pela frente, com um intervalo de 15 minutos. Primeiro ato, Mãe Coragem aparece no palco, empurrando seu carroção de toldo branco, ao lado de seus três filhos. Segundo ato, Mãe Coragem negocia com o cozinheiro do Comandante do regimento militar a venda de uma ave, uma galinha branca. Ouvia-se tudo em Alemão e a tradução em Português era projetada, simultaneamente, na parte superior do arco, acima do palco do TSP. Muito bom! Legendas perfeitas, sem erros morfossintáticos, tudo de alto nível! Foi assim:
In den Jahren 1625 und 1626 zieht Mutter Courage im tross der schwedischen heere durch Polen. Vor der festung Wallhof trifft sieihren sohn wieder. - Glücklicher verkauf eines Kapauns und grosse tage des kühnen sohnes.
Daneben die Küche. Kanondendonner. Der Koch streitet sich mit Mutter Courage, die einen Kapaun verkaufen will.
Meu professor de Alemão trouxe-me o texto de Brecht e o segundo ato para lermos juntos na aula da semana passada. É a cena em que Mãe Coragem tenta negociar a venda de uma galinha ao cozinheiro do comandante do QG. São protestantes lutando contra católicos, em pleno século XVII. Ouve-se, ao fundo, sons de bombardeio e de tiros de canhão. Eu esperava que o Berliner Ensemble desse um tratamento mais contemporâneo ao texto de Brecht, situando a batalha em um outro período histórico e, quiça, em outro país. Não foi o que ocorreu! A apresentação foi clássica e fidedigna ao texto original, não obstante alguns artifícios tecnológicos utilizados na cenografia. As cenas são, segundo o texto de Brecht (contribuição de Elstor Petry-Losereit, meu amigo de Hamburg, Alemanha, que muito tem contribuído com os meus comentários), as seguintes:
Meu professor de Alemão trouxe-me o texto de Brecht e o segundo ato para lermos juntos na aula da semana passada. É a cena em que Mãe Coragem tenta negociar a venda de uma galinha ao cozinheiro do comandante do QG. São protestantes lutando contra católicos, em pleno século XVII. Ouve-se, ao fundo, sons de bombardeio e de tiros de canhão. Eu esperava que o Berliner Ensemble desse um tratamento mais contemporâneo ao texto de Brecht, situando a batalha em um outro período histórico e, quiça, em outro país. Não foi o que ocorreu! A apresentação foi clássica e fidedigna ao texto original, não obstante alguns artifícios tecnológicos utilizados na cenografia. As cenas são, segundo o texto de Brecht (contribuição de Elstor Petry-Losereit, meu amigo de Hamburg, Alemanha, que muito tem contribuído com os meus comentários), as seguintes:
1a. Cena
Primavera em 1624 . Mae Coragem, sua carroca e seus tres filhos. Dois rapazes e uma menina moca, seguem um regimento. Sao detidos por um Oficial e seu Ajudante, eles querem contratar os rapazes como soldados para um proximo combate na Polonia. Mae Coragem nao está de acordo, entoa uma cancao e nela apresenta-se como negociante de grande perícia. Mostra seus documentos e conta que seus filhos foram gerados por homens diversos, durante sua jornada pelos países em guerra. O Oficial a distrae mostrando interesse na sua mercadoria, ela nao nota os sinais da filha que é muda. O Ajudante desaparece com seu filho mais velho chamado Eilif.
2a. Cena
Mae Coagem está negociando o preço de um frango com o cozinheiro do regimento e ouve o Comandante louvando seu filho Eilif que com perícia roubou gado dos camponeses. A mae assustada e preocupada, dá um tapa na cara do filho. O espectador paraleamente pode ver a cena na cozinha e na sala do Comandante.
3a. Cena
Passados tres anos, o segundo filho de M.C. Schweizerkas é Quartel-Mestre. Era assim o responsável pela caixa do regimento. M.C. encontra-se com Yvette Pottier a prostituta do regimento, que lhe conta de sua vida. (cancao da confraternizacao) Em seguida, o cozinheiro e o pároco-militar discutem sobre a situacao política. A conversa é interrompida por tiros e o som de tambores. Um ataque inimigo. No entrevero M.C. procura salvar seus filhos, esfrega cinza na cara da filha para esconder sua beleza. Pede ao filho jogar fora a caixa com o dinheiro, ajuda o pároco a se esconder. Às pressas tira a bandeira do regimento de sua carroca. O rapaz quer salvar a caixa com o dinheiro e é descoberto por soldados poloneses que o prendem e o torturam. O pároco entoa uma cancao “Paixao de Cristo” , visando ao sofrimento do pobre Schweizerkas. M. C. procura vender seus bens para poder regatar seu filho, mas a negociaçao é prolongada demais e o filho é executado. O morto é apresentado a M.C. que afirma nao conhece-lo para salvar sua própria vida.
4a. Cena
M.C. está indignada e quer pedir uma indenizacao pelos estragos que os soldados causaram em sua carroça à procura da caixa com o dinheiro do regimento. Ela canta a cancao da “Grande Capitulacao” para dar ênfase à profunda resignaçao dos dois partidos religiosos que de ambos os lados só perderam. O refrao da cançao: “o homem pensa: Deus guia” (der Mensch denkt: Gott lenkt) demonstra o distanciamento da religiao, da ideologia de guerra.
5a. Cena
Passaram-se dois anos. Neste tempo, M.C. e sua filha Kattrin cruzaram parte dos territórios da Polonia, da Baviera e da Italia. As duas fazem parada num vilarejo totalmente destruído. M.C. oferece cachaca aos poucos moradores que sobreviveram. Nisto aparece o pároco que pede tiras de linho, para fazer curativos nos feridos. De início M.C. se nega, mas finalmente entrega as tiras. Kattrin arriscando sua vida, salva um bebê de dentro de uma casa que está prestes a desabar.
6a. Cena
É 1632, a vivandeira e sua filha acampam às portas da cidade de Ingolstadt. Kattrin é mandada à cidade para comprar nova mercadoria. O pároco procura intimidade, mas M.C. se recusa. A jovem retorna das compras com um ferimento horrível no rosto,; foi assaltada, mas nao entregou a mercadoria. M.C. está decepcionada e perdeu a esperança de um dia poder casar a filha. Qual o homem que vai querer uma muda de rosto desfigurado? E amaldiçoa a guerra.
7a. Cena
A antítese do final da sexta cena segue imediatamente com o início da setima cena. Com a frase: Eu nao deixo que vocês me ponham bicho na guerra (ich lass mir von euch den Krieg nicht madig machen) M.C. está satisfeita com a relativa riqueza angariada, graças à guerra. Entoa uma cançao que conta de sua vida como vivandeira. E seguem de um lugar ao outro com o regimento; junto na carroça também vai o pároco.
8a. Cena
O rei da Suécia, Gustavo Adolfo, é ferido no campo de batalha e morre. Ao longe ouve-sem os sinos. Em seguida espalha-se a notícia da paz. O pároco novamente veste sua batina. M.C. em conversa com o cozinheiro do regimento conta que agora está completamente arruinada, pois o pároco a tinha convencido de comprar mercadoria em demasia que agora no tempo de paz perderam seu valor. O pároco briga com o cozinheiro, pois tem medo de perder a companhia da vivandeira que tinha lhe proporcionado uma boa vida. Ela amaldiçoa a paz. Yvette que há cinco anos é viúva de um oficial, transformou-se numa matrona; acompanha M.C. à cidade onde querem vender às pressas a mercadoria antes que esteja totalmente desvalorizada.
Durante a ausencia de M.C., soldados chegam com Eilif, que recebeu uma última oportunidade de se despedir de sua mae. Ele tinha continuado a assaltar e a matar, afirmando que nao sabia que era tempo de paz. Ele é executado antes da mae retornar ao acampamento. Ela nao vendeu sua mercadoria, pois na cidade soube que em breve a guerra continuaria. O cozinheiro nao lhe contou da execucao do filho. Segue a viagem com ela, no lugar do pároco.
9a. Cena
É outono de 1634 e a guerra já dura dezesseis anos; os Estados alemaes perderam a metade de sua populaçao e estao completamente devastados. M.C. junto com a filha e o cozinheiro mendigam para poder sobreviver. O cozinheiro soube que sua mae foi vítima da colera e que tinha herdado uma pequena bodega. Ele que está cansado desta vida inquieta anima M.C. a ir junto com ele. Ela de início está entusiasmada, mas quando soube que deveria ir só, sem a filha, resoluta coloca-a junto com as tralhas na carroça e segue viagem sem o cozinheiro. A carroça , a filha e a guerra sao sua vida.
10a. Cena
M.C. continua seguindo o regimento. Os soldados estao desmoralizados, emagrecidos, o que sobrou dos uniformes sao apenas farrapos. Passam por um casebre, de dentro ouvem uma voz cantando, louvando a segurança e a felicidade de ter um telhado sobra a cabeça. Mae e filha param, ouvem a cancao até o fim e seguem em silencio.
11a. Cena
Janeiro de 1636, M.C. acampa na cercania de Halle, no patio de um camponês. Ela afasta-se do lugar à procura de mercadoria. Um oficial e dois soldados das tropas imperiais invadem a propriedade e querem obrigar o camponês a dizer onde podem entrar na cidade despercebidos. Kattrin ouve as ameacas, sente o perigo, agarra um tambor, sobe no telhado da casa e o bate com veemencia. Os soldados tentam impedir a jovem, mas sem exito; um dos soldados atira e a fere mortalmente. A valente açao de Kattrin custou-lhe a vida, mas os habitantes da cidade alertados puderam se salvar.
12a. Cena
Na manha seguinte, M.C. volta com as mercadorias que conseguiu. Encontra a filha e custa a acreditar que ela está morta. O camponês recebe uma quantia de dinheiro para sepultar o corpo de Kattrin. M.C. segue só, em sua carroça, junta-se às tropas suecas. Canta a terceira estrofe da cancao da 1a. cena, na esperança de que, pelo menos, Eilif vivo.
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